Como identificar o bar bom e o bar ruim
Um roteiro através do letreiro
Quando tudo isso passar, me convide para um botequim. Uma birosca qualquer. Vou em barzinho, também. Se você rachar a conta, porque as coisas não estão fáceis, vou até em restaurante. Ou a um chope no shopping, como gosta Roberto Dias, o da CPI da Covid. Ginkeria, uisqueria eu já acho esquisito, penso duas vezes, mas se não for um eufemismo para bordel, posso.
Me chame ao bar para brigar comigo, me lembrar o quão fracassado sou, resolver um quiproquó antigo, propostas de emprego, declarações de amor e guerra. Estou há um ano e uns trocados em casa. Qualquer papo furado eu tô furando.
Posso beber junto com aqueles policiais marrentos que costumam parar em Vila Valqueire; ou com os universitários empolgados do Baixo Botafogo. Acho um pouco decadente, mas também topo a nata das artes cênicas da Gávea, apesar de preferir de beber na Praça Mauá, na Lapa e na Mem de Sá.
Não sou um ébrio, longe disso, quase não bebo, mas gosto de observar as opiniões de quem enche o pote nos melhores lugares da cidade. Gosto de comer bem e pagar pouco. Numa dessas, resolvi fazer um guia pra turma jovem que pretende começar a frequentar os bares da cidade quando a pandemia acabar.
Números
Evite passar na mesma calçada de estabelecimentos com números. São sempre ambientes escuros — dizem que é temático — e preço do prato mais barato normalmente é mais caro do que o número que está no letreiro. Rota 66, Caminho 89, Espaço 115, Casa do Caralho 69, nada disso presta.
Nomes canalhas
Outra dica. Bares são locais feitos para operários esquecerem do trabalho. Passe longe dos estabelecimentos nomes patronais, como Escritório e Firma. Tem um no bairro da Piedade que se chama Fábrica 40º. Tem equívoco maior do que você batizar seu negócio com o nome de um lugar de onde as pessoas justamente estão fugindo? Imagina uma fábrica quente dessa!
Piadolas, brandings
Desculpe o amargor, mas também detesto trocadilhozinho safado. Sabe aquela coisa de nomear o bar com um nome que é feito meio que pra zoar com as esposas e os colegões do trabalho? Bar ‘Hora Extra’. Aí a mulher liga, o cara diz que tá na ‘Hora Extra’. Ou o cara liga e ela diz: tô ‘No Trânsito’. O nome do bar é Trânsito. Bar Beiro, Bar Buda, Bar Bicha. Pare já.
Nome grande é outro horror. Cá perto tem um chamado O Bar Mais Fueda da Lapa. Veja só a petulância, rapaz. Nada contra o dono, que sequer conheço. Só discordo do conceito.
Bebo aonde?
Que que sobra, então? Todo o resto. Os melhores bares que frequentei são simples e deliciosos justamente por serem simples. Nome de gente é um bom caminho. Adonis. Com apóstrofo e S, então, é coisa fina. Chico’s Bar, Bar Salete. Com sobrenome, ou característica da família. Bar do Gomes, Bar Três Irmãos. Nome do bairro é unanimidade. Bar Urca, Bar Leblon.
Herança de avô, causador de dívida, ganha-pão da família, faculdade do filho, seja lá a origem ou o motivo, bares têm alma. Para o dono e para o cliente. Ali, comemoramos um novo emprego, lamentamos uma demissão. Encontramos e desfazemos relacionamentos. Bebemos o bebê e o defunto. Crescemos a barriga e bradamos que voltaremos à dieta no dia seguinte, rindo da própria promessa. Subestimamos a pimenta, que arde a língua e nos faz beber mais. E a bebida esfria a garganta, e pede uma pimentinha.
Me chame, quando isso passar. Que a segunda dose da vacina nos permita outras tantas de cachaça por aí. Veja lá onde pisa.